25 de junho de 2009

Tartufo - Molière

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Referência:

Molière. Tartufo. Tradução: Jacy Monteiro. São Paulo: Abril Cultural, 1983.

ATENÇÃO! Este mesmo livro também contém as obras "Escola de Mulheres", trad. Millôr Fernandes (é a mesma obra, mas não é a mesma referência do post anterior), e "O Burguês Fidalgo", trad. de Octavio Mendes Cajado.

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Comentário:

Apesar do alarde, nem achei a melhor obra de Molière até agora (das que li). Por enquanto, é a mais crítica de forma evidente (acho que todas são críticas, mas algumas são mais debochadas... achei essa quase didática).

Este livro foi traduzido do original em francês, cujo título é " Le Tartuffe" (é de1664)e o nome verdadeiro de Molière era Jean-Baptiste Poquelin (1622-1672).

Possui notas - muito interessantes - de Robert Jouanny para a edição francesa de Éditions Garnier Frères.

CURIOSIDADES:

(1) Nas minhas aulas de teatro, soube que "Tartufo" foi censurada e por 6 anos não pôde ser encenada. Molière, que tinha formação como advogado, defendeu sua obra alegando que ela não criticava a fé, mas os maus religiosos. Mas a obra só foi "liberada" depois que ele mudou o final, introduziu o personagem "Senhor Leal" e mostrou o Rei(Luís XIV) como soberano justo que desmascara as falsidades.

(2) No livro "Mestres do Teatro I", John Gassner conta que Tartufo foi proibido pelo rei e que, após essa censura, Molière escreveu Don Juan, dando vida a uma "lenda" que existia desde a Idade Média. Ele faz considerações sobre a época:

"A França era varrida por uma reação contra a crescente vaga de ceticismo religiosos e científico. O pensamento liberal era denunciado pelas seitas religiosas, entre as quais as mais ativas eram os Jesuítas e os Janenistas. A devoção se transformava em moda e nem todas as suas manifestações eram desinteressadas e sinceras. (...) Custou ao autor ser acusado de ateu por aqueles cujas sensibilidades haviam sido ofendidas. (...) Insistiu que não havia atacado a religião e sim a forma pela qual podia ser usada para disfarçar o interesse próprio."

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Personagens dos trechos selecionados:

Orgon é o chefe de família que recebe Tartufo como hóspede em sua casa e fica cego com suas evocações religiosas.

Mariane é filha de Orgon.

Dorine é dama de companhia de Mariane, filha de Orgon.

Cléante é cunhado de Orgon.

Valère é o pretendente de Mariane.

Elmire é a segunda mulher de Orgon (ele é viúvo e bem mais velho que ela) e madrasta de Mariane e Damis.


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Trechos selecionados:


DORINE:
[para Senhora Pernelle, mãe de Orgon, sobre uma dama conhecida que ela cita]

"O exemplo é admirável e esta dama é boa! É verdade que vive como pessoa austera, mas foi a idade que lhe meteu na alma esse zelo ardente e sabe-se que é pudica contra a própria vontade. Enquanto pôde atrair as homenagens de muitos corações, gozou de todas as vantagens de que dispunha; vendo, porém, diminuir o brilho de seus olhos, propõe-se renunciar ao mundo que a abandona, mascarando a debilidade de seus atrativos já gastos com o véu pomposo de uma grande sabedoria. São essas as vicissitudes das coquetes do tempo. Para elas é duro ver os galantes baterem em retirada. Em tal abandono, a sombria inquietação não lhes concede outro recurso senão o de representar o papel de mulher pudica; e a severidade dessas mulheres de bem tudo censura e nada perdoa; censuram acerbamente a vida de qualquer um, não por caridade mas impelidas pela inveja, que não poderia permitir que outra gozasse dos prazeres, cujos desejos o declínio da idade já extinguiu."
(pgs. 17 e 18)


CLÉANTE:
[para Orgon, sobre os bons e honestos devotos]

"(...) neles não se vê esse fasto insuportável e a devoção deles é humana, é tratável; não se metem a censurar-nos todas as ações. Acham que é orgulho demasiado corrigir a todos e abandonando aos outros a arrogância das palavras, é com suas ações que procuram corrigir as nossas. Para eles a aparência do mal não tem grande importância e são levados sempre a pensar bem do próximo. Nada de intrigas, nada de conluios com eles. Sua única preocupação é procurar viver bem; nunca se escarniçam contra um pecador qualquer; odeiam somente o pecado e não pretendem esposar, com zelo extremo, os interesses do Céu mais do que o próprio Céu.(...)"
(pgs. 30 e 31)


DORINE:
[para Orgon, sobre ele querer forçar a filha a casar-se com Tartufo]

"(...) Saiba que se arrisca a virtude de uma moça quando se lhe contraria o gosto no casamento; que a intenção de viver honestamente depende das qualidades do marido que se lhe dá; e aqueles que, em toda parte, são apontados com o dedo, muitas vezes fazem das próprias mulheres o que elas são."
(pg. 42)


VALÈRE:
[para Mariane, achando que ela queria trocá-lo por Tartufo]

"(...) Coração que nos esquece nos lança um desafio e é preciso, para esquecê-lo, usar de todos os meios: se não se conseguir, deve-se pelo menos fingir. E não se perdoa nunca a covardia de demonstrar amor a quem nos abandona."
(pg. 59)


TARTUFO:
[para Elmire, quando ela finge gostar dele para desmascará-lo]

"Posso dissipar-lhe esses temores ridículos, minha senhora, pois conheço a arte de afastar os escrúpulos. De fato, o Céu proíbe certos contentamentos;(é um celerado que fala)* mas sempre se acha uma maneira de acomodar; conforme necessidades diversas, existe uma ciência destinada a estender os liames de nossa consciência e retificar o mal da ação com a pureza da intenção.(...)"

*trata-se de uma rubrica de Molière.

(pg. 109)

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